segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Comércio do sexo não tem hora

Muitos leitores podem considerar a cena inusitada para uma manhã de um dia comum da semana, mas faz parte do cotidiano do lugar, desde que sua população começou a aumentar, consideravelmente, há três anos, com a construção das usinas. Durante todo o dia, enquanto a equipe conversava com autoridades e moradores da cidade, todos os entrevistados citaram um mesmo problema que agrava a rotina do local: a prostituição.


A equipe do Diário da Amazônia chegou a Jacy-Paraná às 8h da última sexta-feira. As ruas do distrito, que até então estavam desertas e silenciosas, começavam a despertar. Pouco tempo depois já era possível ouvir a música em alto volume e observar os bares começarem a receber seus primeiros clientes. Muitos leitores podem considerar a cena inusitada para uma manhã de um dia comum da semana, mas faz parte do cotidiano do lugar, desde que sua população começou a aumentar, consideravelmente, há três anos, com a construção das usinas. Durante todo o dia, enquanto a equipe conversava com autoridades e moradores da cidade, todos os entrevistados citaram um mesmo problema que agrava a rotina do local: a prostituição.

“A gente tem tentando combater [a prostituição], orientado, principalmente o envolvimento de menores”, afirma Nilton Barbosa, administrador do distrito. Nilton diz saber que o consumo de entorpecentes agrava a situação. “Quem poderia agir mais seria a Polícia Civil, mas como já estamos carentes dessas autoridades, fica mais difícil”.
Segundo o administrador, apesar de presenciar a situação durante todo o dia, é na parte da noite que o distrito fica “pesado”. “É muita gente. Os trabalhadores da usina [Jirau] passam a semana inteira trancados, quando chega o fim de semana eles vêm pra cá. São 10, 12, 15 ônibus. Vem muita gente”.

Adriana Soares, diretora do posto de saúde, conta que no final de semana os atendimentos ficam mais críticos no lugar, e diz que uma das causas por esse cenário precário é o aumento do fluxo de trabalhadores no distrito, entre sexta-feira e domingo. “Nós trabalhamos 24 horas, convivendo com os prostíbulos”, afirma, referindo-se a cinco quartos de madeira, que ficam em frente ao posto e que, segundo Adriana, funcionam como bordéis. “Tem uma placa escrito ‘pousada’, mas é só fachada”.

Ainda segundo a diretora, o movimento no local não tem hora. “Hoje eu estou estranhando que está calmo. Às 7h, geralmente, já está funcionando”. Enquanto Adriana falava, começamos a ouvir, ao fundo, três estilos de música diferentes, em volume alto, disputando espaço. “Já são quase 11h. Hoje começou tarde”, ela diz. A música vem de caixas de som, conhecidas como junkbox, uma máquina que reproduz a escolha da pessoa, após a inserção de moedas. “Cada quarto desse tem uma caixinha. Agora você imagina todas elas ligadas, ao mesmo tempo, o dia inteiro”.
Conforme a diretora, os quartos, que ficam a menos de 100 metros do posto, são todos de um mesmo dono, que chegou a ameaçar o segurança do local, quando os funcionários fizeram um abaixo-assinado pedindo providências das autoridades. “Uma das mulheres que trabalham aí nesses quartos veio ser atendida aqui [no posto de saúde] uma vez e disse para a gente que ele cobra R$ 4 mil de aluguel”. 

Com as mudanças no distrito, nos últimos anos, Adriana diz que passou a ser comum meninas de 10 a 12 anos apareceram grávidas: “É como a gente sempre diz aqui: as usinas vão deixar muitos herdeiros”.
 
“Rapaz, não mexe com isso não. Deixa o pessoal em paz”
 
Na rua do único posto de saúde do distrito é impossível não notar a contradição: em pouco mais de 900 metros há cerca de 10 bares. Na margem da BR-364, o número aumenta e pode se observar pelo menos mais 30. De acordo com moradores, eles são o chamariz para o que realmente abrigam. “Todos esses barracões de madeira, que parecem bares, são prostíbulos”, diz o dono de uma sorveteria, que não quis dizer o nome “porque é perigoso”.

Os bares que foram abertos às 8h, próximo ao meio-dia já estavam cheios. O carro, identificado com o nome do jornal, chama a atenção e passa a ser alvo de olhares de homens e mulheres. Um comerciante do local se dirige ao fotógrafo afirmando que sabia que ele fazia parte de uma equipe de reportagem e pede: “Rapaz, não mexe com isso não. Deixa o pessoal em paz”.

Próximo às 13h, chega o primeiro ônibus do dia, responsável por trazer trabalhadores do canteiro de obras da Usina Hidrelétrica Jirau, que fica a 40 quilômetros de Jacy-Paraná. Mas esse foi apenas o primeiro. Durante toda a tarde o movimento era constante e aos poucos os operários se juntavam à música alta, que já tocava desde a manhã.

O sol quente não impede que as ruas sejam tomadas por pessoas. Os carros trafegam sem uma ordem aparente, transformando o trânsito em uma perigosa maratona. Com o consumo de bebidas em exagero, as vias públicas também se tornam banheiros a céu aberto.

No início da noite, com a chegada de quase uma dezena de ônibus, o distrito estava como afirmaram os moradores do local: pronto para mais uma noite “pesada”.
 
Pouco a se fazer contra o problema
 
Atuando no distrito de Jacy-Paraná desde outubro do ano passado, o tenente M. Pontes, comandante do grupo de policiais militares pertencente ao 5º Batalhão de Porto Velho, explica que a Polícia Militar não consegue combater a prostituição e quem se beneficia economicamente dela. “É difícil identificar porque mesmo que a mulher trabalhe para alguém, dificilmente vai entregar a pessoa”, explica.

O tenente diz que desde que iniciou os trabalhos no distrito, nunca encontrou menores envolvidos. “As pessoas que trabalham com prostituição sabem que se for encontrado algum menor, o bar será fechado. Elas não arriscam”, afirma.

No último final de semana, foi realizada uma operação em Jacy, que contou com a presença de policiais militares e policiais de trânsito. Na ocasião foram presas cerca de 10 pessoas por posse de entorpecente, embriaguez ao volante e tráfico de drogas. A operação faz parte de uma ação conjunta que vai acontecer todos os meses, principalmente nos dias próximos ao pagamento dos trabalhadores de Jirau.

O tenente explica que para resolver o problema da música alta é necessário uma parceria com a Polícia Ambiental, que já está sendo solicitada. Segundo Pontes, esse apoio garante o uso do decibelímetro, aparelho que mede o nível de pressão sonora, e que apenas a polícia ambiental faz uso. A parceria ainda não foi concretizada, porque, segundo o tenente, “a demanda é grande na Capital”.

Para que os problemas do distrito sejam minimizados, o tenente conta que no próximo mês será formado um Conselho Comunitário, que visa fortalecer e estreitar os laços entre os moradores e a polícia para que a própria comunidade informe os problemas que ocorrem no local, ajudando nas operações e no combate ao crime.


Fonte: Diário da Amazônia

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