quinta-feira, 25 de agosto de 2011

“O que é isso? Vocês me prometeram muito mais”. Seu Amadeu acreditava que ficaria rico com Belo Monte.


Seu Amadeu acreditava que ficaria rico com Belo Monte. Que a construção da barragem seria uma oportunidade para que ele e a família prosperassem. Por isso, defendeu o empreendimento sem titubeios. Acreditou nisso por três anos – até que algumas coisas mudaram.
Representantes do empreendimento realizaram o primeiro contato com Amadeu em 2008. Contaram a ele sobre a obra e sobre o progresso. Explicaram como o seu terreno era parte essencial da barragem – afinal, sem um canal, não haveria 80% da vazão da Volta Grande desviada, e aí não sairiam os migalhawatts prometidos.
No entanto, na hora de receber a bolada que mudaria sua vida – a gorda indenização por sua terra e benfeitorias na margem esquerda do quilômetro 50 da rodovia Transamazônica -, seu Amadeu, o filho e a nora depararam-se com um valor de pouco mais de 90 mil reais.
“90 mil eu não aceito”, reagiu Amadeu Fiok, o acometido. O pai é turco. “O que é isso? Vocês me prometeram muito mais”.
E aí chegou uma intimação, dando prazo para que ele saísse da terra, e dizendo que o valor (na ação, ligeiramente mais baixo) já estava depositado em sua conta. Retrucou: “daqui eu não saio”.
Mas, feito um lutador que toma uma pancada e não sabe bem de onde veio, seu Amadeu não entendeu: ele não tem saída. Está marcado para perder.
Através de um decreto publicado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), que transforma toda a extensão da Volta Grande do Xingu em área de utilidade pública, basta à Norte Energia entrar na Justiça com uma ação de desapropriação contra cada proprietário que se recusar a aceitar os valores propostos pela empresa. E pronto: a indenização está paga e os moradores removidos.
Ditadura e direito“Pra começo de conversa: esse decreto é da ditadura de 40″, comenta a coordenadora do Movimento Xingu Vivo Para Sempre, Antônia Melo. Ela se refere ao decreto-lei que regulamenta as desapropriações em geral, de 1941 – período da ditadura getulista do Estado Novo (1937-1945). Foi baseado neste decreto que a ANEEL declarou de utilidade pública a área da construção de Belo Monte. “Em segundo lugar: as áreas de realocamento já deveriam estar definidas, para que os proprietários pudessem optar entre indenização e o remanejamento”, continua. “E pra quem não queria sair, não queria barragem, mas só sobrou a alternativa de ser indenizado, oferecem valores baixíssimos, e completamente deslocados do mercado imobiliário da própria região – que está explodindo graças à própria especulação em torno da usina. O proprietário não sabe nem o que fazer para defender seus direitos”, critica.
Em se tratando de direitos, a advogada e professora da UFPA, Andréia Barreto, concorda que há irregularidades envolvendo as ações de desapropriação. “Não foi garantido a eles o acesso à Justiça. Quem não aceita a negociação, não encontra amparo legal. Não tem direito à Justiça gratuita. Por um motivo bem simples: essas ações envolvem interesse da União. Isto é: são da Justiça Federal. Nestes casos, quem cuida das defesas é a Defensoria Pública Federal (DPF). E não há DPF em Altamira”, explica. “O que nós temos presente em Altamira e região é a Defensoria Pública Estadual, que não vai atuar nestes casos. Ou seja: ou eles contratam advogado particular, ou não tem defesa”.
Segundo a advogada, também o Ministério Público Federal não é obrigado a atuar nestas ações, porque são causas individuais. “Muitos não podem pagar por advogados particulares. “Ou seja, foram tolhidos da garantia de suas defesas. Há uma ausência das instituições que deveriam acompanhar os desapropriados”, conclui.

Fonte: XinguVivo.org.br



Bunge com "sede" de Usinas!


Uma das maiores processadoras de alimentos do país, a Bunge Brasil anunciou nesta quinta-feira um investimento de US$ 2,5 bilhões (R$ 3,95 bilhões) em aumento de capacidade de produção de açúcar, etanol e energia elétrica.

Cerca de 55% desse total será destinado à parte agrícola: plantio e renovação de canaviais, aquisição de máquinas, entre outros.

O anúncio acontece um dia depois de a Petrobras --em meio a críticas sobre a falta de capacidade do setor de atender a demanda pelo etanol-- divulgar investimentos de R$ 520,7 milhões em Goiás em parceria com o grupo São Martinho.

Desde a crise de 2008, praticamente não foi feito nenhum grande investimento em plantio e ampliação de capacidade no setor. A crise pegou diversas usinas com alto endividamento, e muitas entraram em recuperação judicial ou foram vendidas.

O plano de investimentos da Bunge, anunciado pelo presidente e CEO da companhia, Alberto Weisser, em reunião de duas horas com a presidente Dilma Rousseff e o ministro de Minas e 
Energia, Édison Lobão, em São Paulo, compreende os anos de 2012 a 2016.

Ele deverá ampliar em 50% a capacidade de processamento de cana-de-açúcar das oito usinas do grupo de 21 milhões de toneladas para 30 milhões de toneladas.

Segundo o presidente da Bunge Brasil, Pedro Parente, os investimentos em plantio e renovação de canaviais deverão acompanhar a ampliação da capacidade de moagem.

FALTA DE CANA

Atualmente, as usinas operam aquém da capacidade por falta de cana. "Os investimentos que estamos fazendo neste ano já nos permitirão alcançar a capacidade atual de moagem."

Entre expansão de novas áreas e renovação de canaviais, só em 2011 serão 70 mil hectares, dos quais 50 mil hectares de área própria. Mesmo com esse investimento, Parente não descarta a possibilidade de importar etanol de milho das usinas do Grupo Bunge nos EUA.
Segundo o executivo, a ampliação de capacidade até 2016 visa atender o mercado doméstico, mas também poderá ter como destino o exterior.

"Temos flexibilidade de atuar nas duas pontas, exportando ou importando, de acordo com a necessidade de cada mercado", diz Parente.

No encontro de ontem à tarde, Parente diz que a presidente Dilma demonstrou preocupação em manter um suprimento regular de etanol para não abalar a confiança do consumidor.

COGERAÇÃO

O investimento anunciado elevará em seis vezes a produção de cogeração de energia do Grupo Bunge. Quando estiver em plena capacidade, a energia gerada será capaz de atender a demanda de uma cidade de 4 milhões de habitantes.

Hoje, a Bunge consome cerca de 700 GWh por ano em suas operações. A intenção é tornar-se autossuficiente até 2014 e comercializar o excedente.


Fonte: Folha de S. Paulo

MAB bloqueia a BR 364, em Rondônia


Mais de trezentos manifestantes bloqueiam,  nesta manhã (22/08),  a rodovia BR- 364, próximo ao município de Itapuã do Oeste, em Rondônia.

A ação é organizada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), com participação de trabalhadores e agricultores da região, atingidos pela Usina Hidrelétrica de Samuel, construída há  mais de 26 anos.

Entre os pontos de reivindicação estão um plano de recuperação e desenvolvimento dos municípios atingidos pela barragem, envolvendo as áreas da cultura, educação, produção e infraestrutura; o reassentamento das famílias e ações de fortalecimento da pesca e da aqüicultura na região.

No que se refere ao assentamento, os atingidos cobram que ele deverá atender as exigências das condições do modelo historicamente defendido pelo MAB.

Já com relação à pesca, os atingidos cobram estruturas para beneficiamento e comercialização do pescado, como a implantação de projetos experimentais e de implantação de tanques redes e escavados nas comunidades.

“A construção da Usina de Samuel deixou uma dívida social enorme e as famílias ainda sofrem as consequências. A exemplo, podemos citar a cidade de Itapuã,  que vive um estado caótico em conseqüência da construção de Samuel”, disse Océlio Muniz, da coordenação do MAB.

O Movimento já havia interditado a rodovia no final de março deste ano cobrando medidas e ações da Eletronorte e do estado brasileiro para atender a dívida social histórica existente com as famílias atingidas pela construção da usina de Samuel.

A retomada do protesto no mesmo local também é uma demonstração da insatisfação com os resultados das reuniões e negociações que ocorreram com a empresa.

A mobilização em Rondônia faz parte da Jornada Nacional de Lutas dos trabalhadores, que acontece durante toda a semana. Está sendo preparada uma série de manifestações por todo o país, cobrando mudanças no modelo energético e agrícola brasileiro, para que todos tenham terra, condições de produção, emprego e renda no meio rural. A proposta envolve medidas como a Reforma Agrária, incentivos à agricultura familiar, a produção de alimentos saudáveis e a defesa do Código Florestal.

Fonte: Assessoria/MAB

Santarém contra Belo Monte


O dia 20 de agosto de 2011 foi marcado, em várias cidades do Brasil e do mundo, por manifestações de protesto contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu, município de Altamira/PA. Em Santarém não foi diferente. Cerca de 100 pessoas atenderam a convocação da UES e da FDA  e foram às ruas dizer não ao “Belo Monstro” do governo Dilma. A concentração para o ato começou por volta das 18 horas na Praça da Matriz. Os manifestantes caminharam pela orla da cidade, com faixas, cartazes e entoando palavras de ordem como “Não, não, não. Belo Monte não. O Xingu é nosso e não abrimos mão!”.

A hidrelétrica de Belo Monte, cuja construção custará cerca de R$ 30 bilhões aos cofres públicos, é considerada por inúmeros especialistas, movimentos sociais e ambientalistas como um verdadeiro desastre social e ambiental, que causará a destruição da vida no rio Xingu e a expulsão dos povos indígenas de suas terras. Além disso, a energia gerada pela usina não será destinada aos povos da Amazônia, mas apenas para as grandes empresas eletro-intensivas do centro-sul e multinacionais que exploram as riquezas da Amazônia, como a Vale do Rio Doce, ALCOA e MRN.

Durante a caminhada pela orla da cidade, os manifestantes chamaram atenção da sociedade para a possibilidade de construção de 5 usinas hidrelétricas no rio Tapajós, obra que, se concretizada, levará a uma dramática destruição da biodiversidade do rio que banha Santarém. Os povos tradicionais do Tapajós, assim como os povos indígenas do Xingu, estão na iminência de serem expulsos de suas terras e verem sua cultura destruída em virtude da construção de hidrelétricas.

Os estudantes presentes na manifestação aproveitaram o momento para inserir pautas ligadas à educação. “O governo Dilma gastará 30 bilhões de reais na construção de Belo Monte, para destruir a natureza e os povos indígenas. Ao mesmo tempo, se recusa a investir verbas suficientes para garantir uma educação pública de qualidade. Por isso, estamos na rua contra Belo Monstro e em defesa da aplicação de 10% do PIB brasileiro na educação”, afirmou Heloise Rocha, diretora do DCE-UFOPA e militante do movimento Juntos! Juventude em luta.


Outra participação de destaque foi a do Movimento Popular de Luta por Moradia de Santarém. Margarete Teixeira, uma das lideranças do movimento, lembrou que a construção de Belo Monte vem expulsando centenas de famílias de suas terras e casas, aumentando o caos social no município de Altamira. Ademais, Margarete criticou duramente os governos federal, estadual e municipal, que não têm uma política consistente de habitação e moradia, situação que motivou cerca de 500 famílias a ocuparem a margem direita da Av. Fernando Guilhon em Santarém – bairros Vista Alegre do Juá e Salvação.


O ato público em Santarém foi parte de um processo de mobilização internacional contra Belo Monte. Em 13 países estão confirmadas manifestações em frente às embaixadas brasileiras. A maior parte delas ocorrerá na segunda-feira, 22 de agosto. No Brasil, houve protestos em 13 cidades. Os maiores aconteceram nas cidades de São Paulo e Belém, que reuniram cerca de mil pessoas cada um.
Para Anderson Castro, liderança do movimento estudantil da capital paraense, “Este ato tem uma importância fundamental, pela primeira vez a gente consegue unir forças a nível internacional para lutar contra a construção de barragens na Amazônia e nós fazemos um convite para a juventude indignada que venha para somar nesta luta”.

Uma característica importante desse processo de luta contra Belo Monte é o forte protagonismo da juventude. A cada dia que passa, os jovens brasileiros adquirem mais consciência do seu papel histórico e por isso vêm tomando as ruas em defesa de pautas políticas, sociais e ecológicas. Em Santarém isso foi muito claro no ato público contra Belo Monte: a absoluta maioria dos manifestantes era formada por jovens estudantes, universitários e secundaristas, que deram um clima agitado e descontraído ao protesto.


A passeata encerrou na Praça São Sebastião, local onde ocorria a Feira da cultura popular. No entanto, a luta contra as hidrelétricas na Amazônia não se encerra no dia 20. Os movimentos sociais e a juventude indignada estão dispostos a seguir a luta em defesa dos rios, das florestas e da vida na Amazônia. De acordo com Ib Tapajós, coordenador geral da UES, “o combate a Belo Monte é uma questão crucial para nós, pois trata-se de uma luta histórica que já dura mais de vinte anos. Barrar Belo Monte significaria dar um exemplo a todos os povos da Amazônia de que é possível enfrentar o grande capital em defesa de uma Amazônia soberana. Por isso, seguiremos firmes nessa batalha”.


Fonte: Blog da UES

Ibama condena os rios Teles Pires e Tapajós com licença para as empreiteiras

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), concedeu à Companhia Hidrelétrica Teles Pires a Licença de Instalação para construção da Usina Hidrelétrica Teles Pires, de 1,820 mil MW, que será erguida no rio de mesmo nome. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse que 75% da capacidade de gerar energia necessária para os próximos dez anos no País já está contratada.


São Paulo - O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), concedeu à Companhia Hidrelétrica Teles Pires a Licença de Instalação para construção da Usina Hidrelétrica Teles Pires, de 1,820 mil MW, que será erguida no rio de mesmo nome.

Esta empresa é uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) que tem como acionistas a Neoenergia (50,1%) e holding do Grupo Neoenergia, a Eletrosul (24,5%) e Furnas (24,5%), ambas subsidiárias da Eletrobras, e a Odebrecht Participações e Investimentos (0,9%).Já o Consórcio Construtor Teles Pires é formado pela Odebrecht Energia, Voith e Alstom.

O investimento previsto pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) é de R$ 3,6 bilhões, terá cinco turbinas, cada uma com 364 MW de capacidade instalada e produzirá energia suficiente para abastecer cinco milhões de habitantes.

O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse que 75% da capacidade de gerar energia necessária para os próximos dez anos no País já está contratada. Segundo ele, nesse período o Brasil vai precisar contratar 61,560 mil MW, considerando-se crescimento médio do PIB de 5% ao ano para esse período em análise.

Transmissão

A proposta de uma linha de reforço para a interligação entre o Sudeste e Sul está quase pronta e deve ser enviada para o Ministério de Minas e Energia ainda no segundo semestre, afirmou Tolmasquim. Segundo ele, o projeto pode ir a leilão no ano que vem. "Estamos com a proposta quase pronta para enviar ao governo", disse Tolmasquim em palestra promovida pela Câmara de Comércio Brasil-França.

Tolmasquim disse que o objetivo é dar mais segurança à Região Sul do País, onde o nível dos reservatórios oscila bastante. Ele afirmou que as linhas atuais dão conta de atender a demanda. "O Sul poderá receber mais a energia do Sudeste. Temos que fortalecer o suprimento do sul, que hoje está bom, mas queremos melhorar", disse. O presidente da EPE acrescentou que no último leilão o Sul teve um reforço importante, com projetos de energia eólica na região.

Mudança

O Grupo Isolux Corsán informou que decidiu transferir para o Brasil a sede da empresa responsável pelas atividades de concessões de rodovias e transmissão de energia e geração de energia solar e investir R$ 5 bilhões no país até 2014. A empresa tem presença constante nos leilões de transmissão de energia promovidos pela Aneel.


terça-feira, 23 de agosto de 2011

Relator de Direitos Humanos retorna ao Pará para monitorar conflitos da Gleba Nova Olinda

Um ano e meio depois dos conflitos territoriais e ambientais ocorridos na Gleba Nova Olinda, o Relator Nacional para o Direito Humanos à Terra, Território e Alimentação, Sérgio Sauer, retorna a Santarém para averiguar a implementação das recomendações editadas em 2009 às autoridades locais e nacionais. A Relatoria esteve no local para conversar com as lideranças do Movimento em Defesa da Vida e da Cultura do Rio Arapiuns (MDVCA), e uma das preocupações foi a de fortalecer o trabalho dos defensores de direitos humanos ameaçados de morte.


Um ano e meio depois dos conflitos territoriais e ambientais ocorridos na Gleba Nova Olinda, o Relator Nacional para o Direito Humanos à Terra, Território e Alimentação, Sérgio Sauer, retorna a Santarém para averiguar a implementação das recomendações editadas em 2009 às autoridades locais e nacionais.

O Relator esteve em Santarém em novembro de 2009, quando diagnosticou problemas e demandas das comunidades com direitos violados, especialmente as que moram na Gleba Nova Olinda. Na época, comunitários haviam retido duas balsas no rio Arapiuns, como forma de denunciar a extração ilegal de madeira por parte de empresas. A Relatoria esteve no local para conversar com as lideranças do Movimento em Defesa da Vida e da Cultura do Rio Arapiuns (MDVCA), e uma das preocupações foi a de fortalecer o trabalho dos defensores de direitos humanos ameaçados de morte. Até hoje uma das lideranças precisa receber proteção policial pelo Programa Estadual de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos.

O retorno da Relatoria em Santarém acontecerá para averiguar o cumprimento das recomendações e para discutir com as comunidades algumas notícias recebidas a partir de reuniões realizadas em Brasília. O Relator entregou um relatório
 
[1] sobre os conflitos a diversas autoridades, como Ministério da Justiça, Secretaria de Direitos Humanos, FUNAI e a Procuradoria Federal dos Direitos dos Cidadãos – PFDC. Também esteve presencialmente em órgãos públicos, como a FUNAI, onde discutiu a necessidade da demarcação do Território Indígena Maró.

O Relator Sérgio Sauer estará na cidade a partir desta quinta-feira (18) e estará disponível para entrevistas a imprensa. Os contatos podem ser feitos pelos telefones:

Gladstone Leonel – 061 8255 2835
Carolina Alves – 093 9143 2253
Laura Schühli – assessora de comunicação da Plataforma Dhesca Brasil: 041 8858 9600

Saiba mais sobre a Relatoria:

As Relatorias de Direitos Humanos são uma iniciativa da sociedade civil brasileira, que têm como objetivo contribuir para que o Brasil adote um padrão de respeito aos direitos humanos econômicos, sociais, culturais e ambientais. O projeto foi implantado pela rede Dhesca Brasil em 2002, inspirado no modelo dos Relatores Especiais da ONU.

O desafio dos/as Relatores/as é o de diagnosticar, relatar e recomendar soluções para violações apontadas pela sociedade civil. Para verificar as denúncias acolhidas, as Relatorias visitam os locais realizando missões, audiências públicas, incidências junto aos poderes públicos e publicam relatórios com recomendações para a superação dos problemas identificados.

Mais informações: www.dhescabrasil.org.br


Fonte: DHESCA BRASIL

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Aldo Rabelo em dia "inspirado" relata a vida dos povos da floresta!!!

Fotomontagem


A harmonia entre os chamados povos da floresta e o meio em que vivem - na verdade sobrevivem - não passa de ficção produzida para filmes como Avatar, de James Cameron, que levam às lágrimas plateias confortavelmente instaladas em modernas salas de cinema dos shopping centers, cercadas de praças de alimentação, onde ao estalar de dedos aparece como por mágica qualquer tipo de comida desejada pelo emocionado espectador. Provavelmente a maioria, ao saborear o suculento bife ou a fresca salada não faz a menor ideia da luta entre o homem e meio ambiente na Amazônia, nas quantidades de demandas por alimento saudável, livres de parasitas de todos os tipos que disputam com o ser humano o direito à vida. Talvez seja essa a real “verdade inconveniente”. 

Se os chamados povos da floresta, índios e caboclos, depois de séculos de luta contra o meio inóspito, ainda ali vivem como viviam seus antepassados há centenas ou milhares de anos, certamente não é porque a tais povos satisfaçam as condições de vida características dessas eras passadas - quando se vivia 30 anos em média - mergulhados no isolamento, completamente dominados pelas forças da natureza, perambulando nus ou seminus, abrigados em choças insalubres, infestadas de insetos e fumaça, lutando em condições absolutamente desiguais contra o meio hostil, que não lhes permite ir além das condições mais rústicas e primitivas de vida de seus ancestrais.
 (pg. 14)

Há ainda trechos de uma obra de Josué de Castro, escrito em um outro contexto, "justificam" a posição do ruralista:

Assim se apresenta o caso da conquista econômica da Amazônia: luta tenaz do homem contra a floresta e contra a água. Contra o excesso de vitalidade da floresta e contra a desordenada abundância da água dos seus rios. Água e floresta que parecem ter feito um pacto da natureza ecológica, para se apoderarem de todos os domínios da região. O homem tem que lutar de maneira constante contra esta floresta que superocupou todo o solo descoberto e que oprime e asfixia toda a fauna terrestre, inclusive o homem, sob o peso opressor de suas sombras densas, das densas copas verdes de seus milhares de espécimes vegetais, do denso bafo de sua transpiração. Luta contra a água dos rios que transformam com violência, contra a água das chuvas intermináveis, contra o vapor d’água da atmosfera, que dá mofo e corrompe os víveres. Contra a água estagnada das lagoas, dos igapós e dos igarapés. Contra a correnteza. Contra a pororoca. Enfim, contra todos os exageros e desmandos da água fazendo e desfazendo a terra. Fertilizando-a e despojando-a de seus elementos de vida. Criando ilhas e marés interiores numa geografia de perpétua improvisação, ao sabor de suas violências...... “Para vencer a força desadorada da natureza ainda em formação, para abrir brechas nesses cerrados batalhões de árvores inexpugnáveis, seria necessária uma sábia estratégia do elemento humano”. (pag. 15) 

Veja todo o relatório do ruralista AQUI!


Fonte: Blog do Cândido

Comércio do sexo não tem hora

Muitos leitores podem considerar a cena inusitada para uma manhã de um dia comum da semana, mas faz parte do cotidiano do lugar, desde que sua população começou a aumentar, consideravelmente, há três anos, com a construção das usinas. Durante todo o dia, enquanto a equipe conversava com autoridades e moradores da cidade, todos os entrevistados citaram um mesmo problema que agrava a rotina do local: a prostituição.


A equipe do Diário da Amazônia chegou a Jacy-Paraná às 8h da última sexta-feira. As ruas do distrito, que até então estavam desertas e silenciosas, começavam a despertar. Pouco tempo depois já era possível ouvir a música em alto volume e observar os bares começarem a receber seus primeiros clientes. Muitos leitores podem considerar a cena inusitada para uma manhã de um dia comum da semana, mas faz parte do cotidiano do lugar, desde que sua população começou a aumentar, consideravelmente, há três anos, com a construção das usinas. Durante todo o dia, enquanto a equipe conversava com autoridades e moradores da cidade, todos os entrevistados citaram um mesmo problema que agrava a rotina do local: a prostituição.

“A gente tem tentando combater [a prostituição], orientado, principalmente o envolvimento de menores”, afirma Nilton Barbosa, administrador do distrito. Nilton diz saber que o consumo de entorpecentes agrava a situação. “Quem poderia agir mais seria a Polícia Civil, mas como já estamos carentes dessas autoridades, fica mais difícil”.
Segundo o administrador, apesar de presenciar a situação durante todo o dia, é na parte da noite que o distrito fica “pesado”. “É muita gente. Os trabalhadores da usina [Jirau] passam a semana inteira trancados, quando chega o fim de semana eles vêm pra cá. São 10, 12, 15 ônibus. Vem muita gente”.

Adriana Soares, diretora do posto de saúde, conta que no final de semana os atendimentos ficam mais críticos no lugar, e diz que uma das causas por esse cenário precário é o aumento do fluxo de trabalhadores no distrito, entre sexta-feira e domingo. “Nós trabalhamos 24 horas, convivendo com os prostíbulos”, afirma, referindo-se a cinco quartos de madeira, que ficam em frente ao posto e que, segundo Adriana, funcionam como bordéis. “Tem uma placa escrito ‘pousada’, mas é só fachada”.

Ainda segundo a diretora, o movimento no local não tem hora. “Hoje eu estou estranhando que está calmo. Às 7h, geralmente, já está funcionando”. Enquanto Adriana falava, começamos a ouvir, ao fundo, três estilos de música diferentes, em volume alto, disputando espaço. “Já são quase 11h. Hoje começou tarde”, ela diz. A música vem de caixas de som, conhecidas como junkbox, uma máquina que reproduz a escolha da pessoa, após a inserção de moedas. “Cada quarto desse tem uma caixinha. Agora você imagina todas elas ligadas, ao mesmo tempo, o dia inteiro”.
Conforme a diretora, os quartos, que ficam a menos de 100 metros do posto, são todos de um mesmo dono, que chegou a ameaçar o segurança do local, quando os funcionários fizeram um abaixo-assinado pedindo providências das autoridades. “Uma das mulheres que trabalham aí nesses quartos veio ser atendida aqui [no posto de saúde] uma vez e disse para a gente que ele cobra R$ 4 mil de aluguel”. 

Com as mudanças no distrito, nos últimos anos, Adriana diz que passou a ser comum meninas de 10 a 12 anos apareceram grávidas: “É como a gente sempre diz aqui: as usinas vão deixar muitos herdeiros”.
 
“Rapaz, não mexe com isso não. Deixa o pessoal em paz”
 
Na rua do único posto de saúde do distrito é impossível não notar a contradição: em pouco mais de 900 metros há cerca de 10 bares. Na margem da BR-364, o número aumenta e pode se observar pelo menos mais 30. De acordo com moradores, eles são o chamariz para o que realmente abrigam. “Todos esses barracões de madeira, que parecem bares, são prostíbulos”, diz o dono de uma sorveteria, que não quis dizer o nome “porque é perigoso”.

Os bares que foram abertos às 8h, próximo ao meio-dia já estavam cheios. O carro, identificado com o nome do jornal, chama a atenção e passa a ser alvo de olhares de homens e mulheres. Um comerciante do local se dirige ao fotógrafo afirmando que sabia que ele fazia parte de uma equipe de reportagem e pede: “Rapaz, não mexe com isso não. Deixa o pessoal em paz”.

Próximo às 13h, chega o primeiro ônibus do dia, responsável por trazer trabalhadores do canteiro de obras da Usina Hidrelétrica Jirau, que fica a 40 quilômetros de Jacy-Paraná. Mas esse foi apenas o primeiro. Durante toda a tarde o movimento era constante e aos poucos os operários se juntavam à música alta, que já tocava desde a manhã.

O sol quente não impede que as ruas sejam tomadas por pessoas. Os carros trafegam sem uma ordem aparente, transformando o trânsito em uma perigosa maratona. Com o consumo de bebidas em exagero, as vias públicas também se tornam banheiros a céu aberto.

No início da noite, com a chegada de quase uma dezena de ônibus, o distrito estava como afirmaram os moradores do local: pronto para mais uma noite “pesada”.
 
Pouco a se fazer contra o problema
 
Atuando no distrito de Jacy-Paraná desde outubro do ano passado, o tenente M. Pontes, comandante do grupo de policiais militares pertencente ao 5º Batalhão de Porto Velho, explica que a Polícia Militar não consegue combater a prostituição e quem se beneficia economicamente dela. “É difícil identificar porque mesmo que a mulher trabalhe para alguém, dificilmente vai entregar a pessoa”, explica.

O tenente diz que desde que iniciou os trabalhos no distrito, nunca encontrou menores envolvidos. “As pessoas que trabalham com prostituição sabem que se for encontrado algum menor, o bar será fechado. Elas não arriscam”, afirma.

No último final de semana, foi realizada uma operação em Jacy, que contou com a presença de policiais militares e policiais de trânsito. Na ocasião foram presas cerca de 10 pessoas por posse de entorpecente, embriaguez ao volante e tráfico de drogas. A operação faz parte de uma ação conjunta que vai acontecer todos os meses, principalmente nos dias próximos ao pagamento dos trabalhadores de Jirau.

O tenente explica que para resolver o problema da música alta é necessário uma parceria com a Polícia Ambiental, que já está sendo solicitada. Segundo Pontes, esse apoio garante o uso do decibelímetro, aparelho que mede o nível de pressão sonora, e que apenas a polícia ambiental faz uso. A parceria ainda não foi concretizada, porque, segundo o tenente, “a demanda é grande na Capital”.

Para que os problemas do distrito sejam minimizados, o tenente conta que no próximo mês será formado um Conselho Comunitário, que visa fortalecer e estreitar os laços entre os moradores e a polícia para que a própria comunidade informe os problemas que ocorrem no local, ajudando nas operações e no combate ao crime.


Fonte: Diário da Amazônia

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Ato mundial contra Belo Monte

Em Santarém ocorrerá também um ato público contra a construção da usina de Belo Monte e das hidrelétricas no rio Tapajós. A manifestação está sendo articulada pela União dos Estudantes de Ensino Superior de Santarém (UES) e pela Frente em Defesa da Amazônia (FDA) e contará com a participação dos movimentos sociais da região que se opõem ao modelo de desenvolvimento econômico predatório imposto pelo governo federal na Amazônia.





A luta contra Belo Monte e o modelo de desenvolvimento do consumo e do mercado, exterminadores de sonhos e vidas, chega a uma etapa decisiva. Os monstros de ferro já chegaram ao Xingu. Máquinas que devoram árvores e aniquilam friamente pássaros e pequenos animais. Gritos e gemidos ecoam na floresta. Governos e políticos corruptos, empreiteiras e mineradoras, o capital, querem matar o rio Xingu para gerar energia para indústrias que poluem, superaquecem e destroem o planeta.
Contra este projeto de morte, milhares, milhões de mulheres e homens já estão organizados. Defendendo a vida, darão, sem hesitar, suas próprias vidas. EM DEFESA DOS POVOS, DA FLORESTA E DOS RIOS DA AMAZÔNIA! ATO MUNDIAL CONTRA BELO MONTE. EM CADA CIDADE, EM CADA PAÍS.
Em Santarém ocorrerá também um ato público contra a construção da usina de Belo Monte e das hidrelétricas no rio Tapajós. A manifestação está sendo articulada pela União dos Estudantes de Ensino Superior de Santarém (UES) e pela Frente em Defesa da Amazônia (FDA) e contará com a participação dos movimentos sociais da região que se opõem ao modelo de desenvolvimento econômico predatório imposto pelo governo federal na Amazônia.
A concentração para o ato será às 18h do Sábado (20) na praça da Matriz, com caminhada pela orla da cidade até o 'Mascotinho', local onde os manifestantes debaterão com a sociedade santarena sobre os reais interesses por trás de projetos como Belo Monte.

Fonte: Blog da UES

terça-feira, 16 de agosto de 2011

I Conferência de Conflitos Socioambientais e Direitos Humanos nas Bacias dos Rios Tapajós (Brasil) e Cauca(Colômbia)


Esta Conferência é uma atividade importante dentro da metodologia do Projeto Lar, o qual procura por intermédio da produção científica e da assessoria a movimentos sociais analisar questões sociais e ambientais nos espaços dos dois países abrangidos, objetivando possibilitar aos diferentes grupos envolvidos pelo projeto que divulguem e reflitam suas atividades e demandas.


A Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), a Universidade Nacional da Colômbia (UNC), Universidade de Utrecht da Holanda, FIAN Internacional, Comissão Pastoral da Terra (CPT) e CENSAT – Água viva (Amigos la Tierra Colombia), vêm por meio deste convidar a sociedade acadêmica e civil para participar da I Conferência de Conflitos Socioambientais e Direitos Humanos nas Bacias dos Rios Tapajós (Brasil) e Cauca(Colômbia), a ser realizada no dia 18.08.2011 no Auditório Wilson Fonseca da UFOPA.

Esta Conferência é uma atividade importante dentro da metodologia do Projeto Lar, o qual procura por intermédio da produção científica e da assessoria a movimentos sociais analisar questões sociais e ambientais nos espaços dos dois países abrangidos, objetivando possibilitar aos diferentes grupos envolvidos pelo projeto que divulguem e reflitam suas atividades e demandas.

Mencionado evento pretende ser um momento de apresentação de casos estudados e acompanhados pelos pesquisadores e entidades que fazem parte do projeto para população em geral e, especialmente, para a academia e órgãos públicos, para socializar com os parceiros locais as perspectivas do projeto, bem como a articulação e construção de propostas e ações em conjunto entre os integrantes do projeto e as instituições ligadas à justiça e aos movimentos sociais.

Por tudo isso, a sua presença é de fundamental importância para nos apropriarmos da relação entre ambiente e cultura e as violações dos direitos humanos nesses casos pesquisados.

Obs: O evento não cobrará ônus do participante

Programação da Conferência clique aqui 

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Indígenas são assassinados no Acre por paramilitares peruanos


Índios isolados fotografados em 2008

Paramilitares peruanos que invadiram o território brasileiro, armados com fuzis e metralhadoras, na fronteira com o Acre, realizaram “correrias”, isto é, fizeram matança organizada de índios isolados, de acordo com o chefe da Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC) da Fundação Nacional do Índio (Funai), Carlos Travassos, que se encontra na base da Frente de Proteção Etnoambiental, no igarapé Xinane.
Cercado com outros quatro funcionários da Funai, Travassos usou a internet para enviar mensagem em que conta que a equipe localizou um novo acampamento usado pelos paramilitares peruanos. O coordenador da Frente de Proteção Etnoambiental, Artur Meirelles, e os mateiros Chicão e Marreta, encontram uma mala com cascas de cartuchos roubados da base da Funai.
- Pegaram a mala e trouxeram para cá. Dentro da mala estava um pedaço de flecha dos isolados. Esses caras fizeram correria de índios isolados, como estava suspeitando, temos agora uma prova cabal - relatou Carlos Travassos.

Travassos disse que é necessário interrogar o mais rápido possível o português Joaquim Antonio Custodio Fadista, que foi preso na sexta-feira (5) pela Polícia Federal na base da Funai e levado para Rio Branco, a capital do Acre.
Fadista já havia sido detido em março pela equipe da Frente de Proteção Etnoambiental por tráfico internacional de droga. Foi entregue à Polícia Federal e extraditado, mas voltou para a região com mais homens.
- Estamos agora mais do que nunca preocupados com a situação dos isolados. Esta situação pode ser um dos maiores golpes já visto nos trabalhos de proteção dos índios isolados das últimas décadas. Uma catástrofe da nossa sociedade. Genocídio. Estamos indignados - afirma.
Segundo Travassos, no final da tarde de sábado um grupo da etnia ashnaninka chegou na base da Funai. Eles ouviram a equipe da Funai no rádio e subiram para levar outras armas da Frente de Proteção Etnoambiental, além de um motor de barco que estava na Aldeia Simpatia.
- Também viram rastros frescos mais embaixo do rio, de três pessoas. Amanhã [domingo] eles voltarão para a aldeia. Pelo menos temos mais armas por aqui agora. Precisaremos fazer novo sobrevoo para constatar a integridade dos isolados ou pelo menos das malocas deles. Essa noticia veio para nos arrebentar.


Fonte:  blogdaamazonia.blog.terra.com.br


Samba: Como Era Verde O Meu Xingu (1983)

Emoldurado em poesias
Como era verde o meu Xingu
Sua fauna, que beleza
Onde encantava o Uirapuru

Palmeiras, carnaúbas seringais
Cerrados, florestas e matagais

Oh, sublime natureza
Abençoada pelo nosso criador
Quando o verde era mais verde
E o índio era o senhor

Kaiamurá, kalapalo e kajurú
Cantavam os deuses livres do verde Xingu

Oh Morena
Morada do sol e da lua
Oh morena
O Paraíso onde a vida continua

Quando o homem branco aqui chegou
Trazendo a cruel destruição
A felicidade sucumbiu
Em nome da civilização
Mas mãe natureza
Revoltada com a invasão
Os seus camaleões guerreiros
Com seus raios justiceiros
Os caraíbas expulsarão

Deixe nossa mata sempre verde
Deixe o nosso índio ter seu chão. 





clique aqui para ouvir essa samba: http://www.4shared.com/audio/TTDyMuvi/Mocidade_1983.htm






Fonte: CIMI

Por um Estado Plurinacional

Há um grande debate inaugurado na América Latina desde o final dos anos 80, que é o da discussão do conceito de plurinacionalidade, e que vem sendo travado pelas comunidades indígenas de países como a Bolívia, o Equador, a Colômbia, o Chile. Mas, para efeitos desta discussão sobre o estado plurinacional, a presença maciça e visível dos indígenas nessa “nova onda de movimentos autóctones” pode-se dizer que tem suas origens recentes no ano de 1990, quando os povos indígenas do Equador decidiram ocupar igrejas e outras instituições governamentais no que ficou conhecido como “primeiro grande levantamento nacional” da era pós-crise dos anos 80 naquele país.



Há um grande debate inaugurado na América Latina desde o final dos anos 80, que é o da discussão do conceito de plurinacionalidade, e que vem sendo travado pelas comunidades indígenas de países como a Bolívia, o Equador, a Colômbia, o Chile. Em dois deles (Equador e Bolívia) já se expressou até mesmo nas novas Constituições, garantindo o direito dos povos originários a organizar suas vidas do jeito que melhor lhes convém, sem as imposições de culturas alienígenas, recuperando elementos ancestrais de sua cosmovisão e até a sua autonomia jurídica. Mas, no Brasil, esse tema aparentemente não significa nada. No que diz respeito aos povos autóctones, o que se fala é que aqui as etnias originárias foram em grande parte dizimadas e que o que resta desta gente não é suficiente para pensar um tema como esse. Pois eu arriscaria dizer que esta é uma falsa argumentação. A plurinacionalidade é um tema que, no Brasil, tem muito para se debater. A própria Constituição de 1988, chamada de “cidadã”, inclui elementos que podem desembocar na proposta de um Estado Plurinacional. Basta que as gentes organizadas dêem consequência ao processo de luta que segue em curso.


A luta indígena por um espaço de poder-ser


É certo que a resistência indígena neste espaço geográfico que os europeus em algum momento chamaram de América Latina - o que foi incorporado pela gente local - não é coisa de agora. Desde que perceberam que os brancos barbudos não eram os deuses anunciados nas lendas, milhares de originários lutaram para retomar suas vidas, mas foram sistematicamente vencidos. Ainda assim, estão na lembrança as grandes investidas de Guaicaipuru, Tupac Amaru, Tupac Katari, Sepé Tiaraju e outros tantos heróis autóctones. Durante estes mais de 500 anos de dominação, em todas as partes de Abya Yala (o nome mais antigo do mundo então conhecido pelos povos que aqui viviam), as gentes originárias lutaram e resistiram. Logo, as mobilizações que hoje assomam em todo o território não são novas e muito menos exclusivas do tempo atual.


Mas, para efeitos desta discussão sobre o estado plurinacional, a presença maciça e visível dos indígenas nessa “nova onda de movimentos autóctones” pode-se dizer que tem suas origens recentes no ano de 1990, quando os povos indígenas do Equador decidiram ocupar igrejas e outras instituições governamentais no que ficou conhecido como “primeiro grande levantamento nacional” da era pós-crise dos anos 80 naquele país. O grito pelo reconhecimento das nacionalidades, território e participação política nasce justamente do esgotamento das políticas econômicas que haviam baseado sua estratégia no modelo agro-exportador, sendo o indígena a mão-de-obra quase escrava nas famosas haciendas. Também é importante observar que esse movimento não brota do chão, ele é fruto da crescente organização das nacionalidades, que vinha sendo gestada sistematicamente desde os anos 60.


Pouco mais de três anos depois do levantamento no Equador, das entranhas do México profundo assomou outra movimentação. Um grupo armado, reivindicando o nome e o sonho de Emiliano Zapata, se insurge em Chiapas, esquecido reduto indígena conhecido apenas por sua “insuperável” pobreza. Naquele primeiro de janeiro de 1994, homens e mulheres autóctones, com as caras cobertas por palicates (espécie de lenços) ou pasamontañas (gorros que cobrem o rosto todo), diziam sua palavra armada: “Ya basta! Nunca más el mundo sin nosotros”. Era mais um elemento da insurgência originária que hoje dá uma nova conformação à América Latina.


Os movimentos do Equador e do sul do México abrem as comportas para uma série de lutas que adormeciam nos anos 90, quando as idéias dominantes tentavam impor a ideológica ideia de que havia chegado o fim das grandes narrativas. Os doze dias de combate empreendidos pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional e a subseqüente negociação que levou ao que ficou configurado como “paz armada”, mostraram a todos os povos indígenas deste continente que o modelo capitalista de organização da vida imposto pelos dominadores não precisava ser o único possível. Então, das profundezas das tradições mais secretas e sagradas dos povos antigos, re-começaram a vicejar desejos, esperanças e novas formas de organizar a vida. A América Latina dava passagem para Abya Yala, a terra do esplendor.


Esse nome dado pelos Kunas ao mundo por eles conhecido antes da chegada dos invasores europeus em 1492 começou a ser falado nas imensidões da grande pátria. E os povos autóctones se puseram de pé. Recuperar suas vidas, sua cultura, suas tradições e reinventar seu modo de organizar a vida passaram a ser não mais um sonho perdido na memória ancestral. Era possível aqui e agora. Não como retorno a um passado cristalizado ou a tradições ultrapassadas, mas como possibilidade de recuperar dialeticamente o jeito único, autóctone, de se viver em Abya Yala, na forma abyayálica de ser, o que na conceituação dos povos indígenas significa redefinir o modelo de desenvolvimento, usando elementos como solidariedade, reciprocidade, cooperação, equilíbrio. O sumac kawsay, o sumac kamaña, o bem viver.


Esses são conceitos que não encontram compreensão na intelectualidade de esquerda latino-americana, tal como expressa Gonzalo Guzmán, dirigente da organização ECUARUNARI, do Equador, nascida em 1972, num despertar da nação kichua. “A proposta do Socialismo do Século XXI, no que diz respeito ao projeto de desenvolvimento, não nos contempla. Temos nossa própria proposta e vamos disputá-la”. É que os indígenas têm bem claro que, ao longo destes 500 anos, mesmo a esquerda e os socialistas sempre estiveram respaldando, de alguma forma, o modelo de desenvolvimento de matriz eurocêntrica, moderna. Mesmo agora, quando surgem as discussões de um novo jeito de ser do socialismo no século XXI, não há incorporação do pensamento indígena. Por isso, os povos autóctones - principalmente os do Equador e Bolívia - insistem em apresentar seu modelo de vida. E assim tem sido a articulação que hoje já se expressa em quase todo o território da antiga “terra nova”. Realizadas quatro grandes Conferências dos Povos de Abya Yala, as comunidades originárias definem estratégias, realizam alianças, reinventam territórios, cunham conceitos e avançam no sentido de ver respeitado seu modo de vida política, econômica, cultural e artística.


O ano de 2000 viu os Aymara, da Bolívia, levantarem bandeiras e fazerem luta conta a privatização da água e, depois, em 2003, iniciarem o processo que culminaria com a derrocada de Sánchez de Lozada e a ascensão de Evo Morales ao cargo de presidente do país. Um presidente da etnia aymara, comprometido com a vida de seu povo. Um homem que ousou chamar uma Assembleia Constituinte, na qual o conceito de estado plurinacional foi instituído, dando vida nova às nacionalidades originárias. Hoje, na Bolívia, os indígenas têm direitos, constituíram eles mesmos esses direitos, seja como deputados constituintes ou como povo em luta, nas ruas. Em que pese todas as críticas ao governo de Evo, esta foi uma conquista das gentes indígenas que ainda precisará de muito tempo para se consolidar, visto que o racismo é algo muito potente na Bolívia. Exemplo disso foi a revolta da “meia-lua”, região tipicamente branca e latifundiária, que chegou a falar em separatismo. Racismo e interesses econômicos fazem um casamento explosivo no país.
Ainda no Equador, foram as comunidades autóctones as protagonistas da ascensão e queda de Lucio Gutierrez na presidência do país, em 2005. As gentes votaram nele para que conduzisse o país a uma nova ordem. Ele as traiu e foi derrubado sem dó. Mais adiante, as nacionalidades apoiaram a eleição de Rafael Correa, que, se não é indígena pelo menos dizia respeitá-los, e, igualmente chamou uma nova Constituinte, na qual o estatuto do estado plurinacional foi conquistado. E ali também foram os indígenas os que se constituíram sujeitos e construíram as novas leis. Hoje, amparados nesse conceito de plurinacionalidade, eles lutam pela preservação dos recursos naturais e pelo direito de se autodeterminarem, travando batalhas contra o governo que eles mesmos elegeram. Porque, por enquanto, estes povos ainda não constituíram um projeto global de nação que possa se apresentar como uma proposta de poder.


Em outros países como a Colômbia e o Peru, governados por presidentes sem compromisso popular, a luta pela ideia do estado plurinacional tem sido intensa, embora sem resultados concretos porque os movimentos ainda não lograram uma organização mais articulada em nível nacional. Também em Honduras, El Salvador, Paraguai e Chile os povos autóctones estão travando grandes e significativas batalhas. E é exatamente isso que torna os dias de hoje um tempo único, porque, pela primeira vez, dezenas de nacionalidades estão em luta, pela mesma coisa, ao mesmo tempo. E, não bastasse isso, não estão em luta sozinhos em seus países, mas numa articulação continental. Até porque as grandes lutas travadas pelas nacionalidades têm sido fundamentalmente contra as indefectíveis transnacionais, responsáveis pela ocupação, no mais das vezes ilegais, das terras autóctones, para implantação de grandes empreendimentos destruidores da natureza, tais como a plantação de pinus ou a construção de grandes barragens. Ou seja, é uma luta contra o capital.


Em todos os cantos deste continente imenso, que se estende desde o sul da Argentina até a ponta do Alaska, as gentes autóctones querem ser chamadas pelos seus nomes – rejeitando o “genérico” termo índios. Querem seu direito à cultura, à participação política, ao território, à autonomia, à autodeterminação. Como Tupac Amaru, Tupac Katari, Guaicaipuru, Cautlemoc, Sepé Tiaraju, Vaimaca, esse povo todo levanta a cabeça e repete no mesmo tom dos zapatistas de Chiapas: “Ya basta! Nunca más el mundo sin nosotros”. A nós, cabe conhecê-los.


Esta luta gigantesca e articulada dos povos pela idéia de “poder-ser”, recuperando sua cultura, sua cosmovisão e seu território, também se expressa no Brasil. O que ocorre é que, por ter uma dimensão continental, o país vê diluída essas manifestações, que acabam aparecendo na mídia comercial como simples “problemas isolados”, falhas na matrix, ou patologias sociais. Analisando os principais jornais de cada estado brasileiro, em uma checagem diária, o que se vê sobre a questão indígena não passa de notícia pontual: problemas relacionados à saúde, ações da Funai, casos de violência do estado contra os indígenas, ou de jagunços por questões de terra. Tudo é muito fragmentado e não há qualquer contextualização, como se as nacionalidades estivessem “normalmente” integradas à vida nacional. Não há reportagens sobre a questão indígena e, mesmo na chamada semana do índio, que ocorre próxima ao dia 19 de abril, tudo o que se vê são as mesmas velhas cantilenas de mostra de problemas sem uma discussão mais profunda. O índio no Brasil parece ser coisa exótica apenas.


Mas, se olharmos com cuidado a região da Amazônia, do Mato Grosso, da Bahia e até de Santa Catarina, pode-se observar que as comunidades originárias estão na mesma luta dos demais povos da América hispânica, articuladas com todas as nacionalidades da grande Abya Yala, buscando as mesmas coisas: território, autodeterminação e recuperação da cultura. Mas, se assim é, por que então a ideia de estado plurinacional não aparece por aqui?


O Estado-Plurinacional


A história do continente é marcada pela violência da invasão europeia, que se expressou na exploração predadora e no colonialismo. Durante mais de 300 anos as comunidades originárias foram dizimadas, escravizadas e submetidas à opressão. Quando iniciaram as guerras de independência, fruto das ideias liberais que varriam o mundo, os chamados criollos (espanhóis nascidos na América) foram a força hegemônica. Apesar de muitas vezes utilizarem instrumentalmente os desejos de liberdade dos povos originários – e, em alguns casos até terem sua ajuda - ao final do processo, com a derrota política de Bolívar, as propostas de integração continental, de fim da escravidão e de respeito aos povos originários se perderam. Assim, apesar da vitória da independência, os povos autóctones ficaram a reboque das repúblicas criollas nascentes - marcadamente dominadas por uma oligarquia rural - e seguiram mergulhados na submissão, uma vez que essas oligarquias não tinham qualquer pretensão de incluí-los na vida das novas nações. Não bastasse isso, os generais vencedores esquadrinharam o território, demarcando fronteiras artificiais, sem levar em conta as nacionalidades que por centenas de anos ali viviam, tal como aconteceu com a nação Mapuche, Aymara e a Guarani. Na região onde hoje é o Uruguai, mesmo tendo sido fundamentais na conquista da independência, lutando lado a lado com Artigas, os povos Charrua, Tapes e Minuano foram chamados para uma armadilha pelo então presidente Fructuoso Rivera, e acabaram massacrados pelas armas do exército. Os chamados “índios” eram vistos como seres de segunda categoria e a melhor saída encontrada, quando não lograram a dizimação, foi a tutela. Trezentos anos depois da conquista eles ainda eram considerados incapazes de gerir a própria vida.


No Brasil, além de não ter acontecido qualquer ruptura verdadeiramente radical no processo de separação de Portugal, a proposta para os originários variou entre destruição, segregação nas chamadas “reservas” ou integração, dentro do projeto de construção de uma única nacionalidade, na qual todos poderiam ser chamados de “brasileiros”. Ainda hoje, na concepção de muitas das entidades que trabalham com os povos originários, se expressa a idéia de que o Brasil é muito grande e as mais de 200 nacionalidades que aqui vivem têm realidades sociais e históricas muito diferenciadas. Assim, não colocam na sua pauta de luta a proposta de um estado plurinacional, aceitando a ideia de uma nacionalidade única, a brasileira. “São Pataxó, mas são brasileiros”, diz Saulo Feitosa, do Conselho Indigenista Missionário, CIMI. Segundo ele, a Constituição brasileira de 1988 conseguiu avançar no que diz respeito ao reconhecimento das diversas culturas que aqui fazem morada, embora, na época, tenha sido levantada a perspectiva do estado plurinacional. “Hoje, no Brasil, não há, junto às comunidades, a perspectiva de um estado independente. Elas conquistaram a autonomia, mas o estado os protege”.


Essa afirmação certamente não aprofunda o que seja a idéia de estado plurinacional que hoje caminha por Abya Yala. Nenhuma nacionalidade propõe a separação do estado-nação onde está fincada, muito menos a segregação da nacionalidade dita “nacional”. A proposta é garantir uma vida política ativa dentro desses estados, apontando para a necessidade da criação de normas democráticas que dêem concretude à autodeterminação. Na Constituição equatoriana, por exemplo, em seu artigo primeiro, isso aparece bem claro: “O Equador é um estado social de direito, soberano, unitário, independente, democrático, pluricultural e multiético”. Ou seja, as nacionalidades adquirem autonomia, mas seguem configurando um espaço geográfico único, tal como reafirma o artigo 83, do capítulo que trata dos povos indígenas e dos negros: “os povos indígenas, que se autodefinem como nacionalidades de raízes ancestrais, e os povos negros ou afroequatorianos formam parte do Estado equatoriano, único e indivisível”. Também a Bolívia, na sua nova Constituição, promulgada em outubro de 2008, propõe no seu artigo primeiro: “A Bolívia se constitui um Estado Unitário Social de Direito, Plurinacional Comunitário, livre, independente, soberano, democrático, intercultural, descentralizado e com autonomia. A Bolívia se funda na pluralidade e no pluralismo político, econômico, jurídico, cultural e lingüístico, dentro do processo integrador do país”.


Conforme estudos da equatoriana Ileana Almeida, o conceito de estado plurinacional aparece ainda de forma muito maleável na América Latina e por isso é também susceptível de mal entendidos. Ela explica que, para os originários, o estado plurinacional não significa em absoluto a assunção da idéia separatista, e sim a possibilidade de, dentro do estado já constituído, alcançar o autogoverno democrático, ou seja, viver com suas próprias regras, garantindo diversas formas e graus de autonomia. E, nesse acaso, a autonomia compreendida não como marginalidade e abandono (como se vê na maioria dos países), mas como orientadora da livre expressão da identidade dos povos. Nesse contexto, a noção de território é de fundamental importância porque, para as nacionalidades originárias, a terra não é só um espaço físico, onde eles vivem, dormem, comem e amam. A terra faz parte da cosmovisão, é morada dos deuses, está intrinsecamente ligada à vida mesma. Daí que a posse real do espaço físico define também essa relação. Ter o domínio da terra é poder governar, de maneira livre, coletiva e comunitária, o que na terra tem.


Por isso, não basta ser como é no Brasil e em outros países, onde os povos têm a terra em usufruto. Ela segue pertencendo à união, é governada por quem não tem qualquer conhecimento da cosmovisão que rege os povos, daí os frequentes desalojos por empresas transnacionais, empresários ou fazendeiros que, em nome do “progresso nacional”, invadem terras e exploram as riquezas. Os chamados “nacionais” sempre se colocam contra os indígenas em momentos como esses, acusando-os de barrarem o desenvolvimento. O caso da demarcação da área Raposa Terra do Sol, em Roraima, que abriga várias nacionalidades do tronco Caribe, é um exemplo concreto. Durante o processo de demarcação, sempre transpassado pelos interesses das gentes poderosas interessadas na riqueza das terras, o tema foi colocado como um obstáculo ao crescimento do país. “Para que tanta terra para essa gente primitiva”, eram as argumentações esdrúxulas que se ouviam nos meios de comunicação. A área da Raposa tem 1.743.089 hectares e está repleta de riquezas minerais e biomedicinais. Mas, os povos que ali vivem não compartilham da visão de que elas devem ser esgotadas. A cosmovisão dos povos amazônicos está centrada na floresta, na água. Ali vivem seus deuses, as forças vitais, e a idéia de “desenvolvimento” dessas nacionalidades em nada se assemelha ao desenvolvimento capitalista predador.


Então, se a proposta é minimamente respeitar a Constituição brasileira de 1988, por que não cumpri-la, como diz o artigo 231: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.” Seria talvez por causa do que diz o parágrafo 6, o qual, apesar de asseverar que as terras são inalienáveis, completa: “ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé”. Ou seja, se a União quiser, pode fazer uso da terra dos originários a seu bel prazer. É certo que a Constituição estipula a necessidade de diálogo com os povos envolvidos, mas isso não significa, em absoluto, que eles sejam realmente ouvidos. Basta observar as manifestações que são feitas em Brasília, sem qualquer resultado prático, como se pode ver no caso da usina Belo Monte que segue sendo construída apesar de todo o rechaço por parte dos povos indígenas e dos ribeirinhos. Na prática, a opinião dos indígenas não vale nada.


O que se observa, na realidade cotidiana, é que, no mais das vezes, a mentalidade colonizada, branca e racista, crê que as gentes originárias não têm capacidade para governar seu próprio espaço e que as terras nas mãos delas serão logo depredadas, vendidas ou trocadas por cachaça e badulaques – como se sob a posse dos brancos isso não acontecesse. É o mesmo olhar superior dos invasores, que omite os séculos de vivência harmoniosa com a natureza, tempo em que as pessoas modificavam, sim, a paisagem, mas sempre dentro de limites muito demarcados de respeito e cuidado. Mesmo nas culturas que lograram constituir impérios, a natureza nunca foi vista como mercadoria ou espaço de simples exploração. Os conceitos de Pachamama, Yvy Rupã, Wallmapu, e outros que estão colados às mais diversas nacionalidades, são todos conceitos que definem uma unidade inseparável entre a terra e os que vivem nela. Então, quem estaria mais apto para cuidar do espaço geográfico? Os originários ou a cultura capitalista que tudo destrói como bem mostra a quase irreversível degradação ambiental provocada por essa forma de organizar a vida?


As nacionalidades que lutam pelo estado plurinacional não negam a nação, embora entendam que as nações que existem hoje na América Latina definem sua existência como uma comunidade histórica, dentro do desenvolvimento capitalista, o qual buscam destruir. Já as nacionalidades são anteriores a esta construção de inspiração europeia, fruto do colonialismo. Por isso o conceito de estado plurinacional aparece como perigoso ao sistema. Porque ao abrir-se à idéia de existência de nacionalidades dentro da nação, acaba também garantindo poder a esses povos, permite que participem ativamente da vida da nação, o que fatalmente os transformará num ponto de tensão junto ao poder constituído. Isso se constitui um problema para o estado capitalista, e não foi à toa que o debate constitucional equatoriano e boliviano foi ferrenhamente disputado.


Assim, levando em consideração as contradições que permanecem tensionadas, por enquanto, nação e nacionalidades aparecem como coisas inseparáveis, o que faz com que a maioria dos movimentos envolvendo os povos ancestrais busque também mudanças profundas na vida da nação constituída. Esse é um debate que os intelectuais de direita sequer consideram, e os de esquerda, em maioria, ainda não lograram compreender, o que faz com que o assunto permaneça praticamente apenas dentro dos movimentos indígenas. Romper com o preconceito e abrir-se a novos (velhos) paradigmas é fundamental para que a esquerda latino-americana possa partilhar destas demandas e incorporá-las aos seus programas e estudos. Observar esse território com olhos mais latino-americanos e menos europeus, pode ser um começo singelo, tal como apontou, nos anos 30 do século passado, o intelectual peruano José Carlos Mariátegui.


A realidade brasileira


O Brasil tem hoje 250 nacionalidades diferentes, com realidades históricas e sociais igualmente diversas. Afirma o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) que 60 delas sequer fizeram contato e outras tantas estão bastante distantes do mundo branco. Por conta dessa diversidade, muitos acreditam ser quase uma bobagem falar em estado plurinacional por aqui. Mas, longe disso se constituir em um obstáculo, deveria ser visto mais como um elemento de impulsão. Se estes povos lograram viver até hoje longe da cultura invasora, o que não teriam de histórias para ensinar sobre como viver no mundo? E aqui que fique bem claro, não se trata de professar a fé ingênua de que as culturas originárias devam permanecer puras e distantes dos olhos cobiçosos dos brancos. A ideia do estado plurinacional justamente trabalha com a proposta de que as comunidades, nos seus mais diversos graus de organização, têm todas as condições de decidir sobre seu destino e constituir suas maneiras próprias de viver e organizar a vida sem a necessidade de serem tutelados.


Paulino Montejo, que atua no movimento Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, reconhece que entre as nacionalidades originárias que vivem no Brasil o termo “estado plurinacional” não aparece nos debates, embora a Constituição defina de forma muito clara o caráter multiétnico do país, reconhecendo o direito à organização social dos povos. “É um ponto de partida para a compreensão de que somos multiétnicos e multiculturais”. Paulino está convicto de que o texto constitucional acaba de vez com a visão integracionista que imperou no país por séculos, mas concorda que o aparato estatal ainda não incorporou esse conceito. “A gente dos órgãos estatais ainda acreditam que os índios são menores de idade, precisando ser tutelados”.


Mas se a palavra “estado plurinacional” não aparece na discussão das nacionalidades originárias que vivem no território hoje chamado de Brasil, isso não significa que não haja luta para garantir a autodeterminação. Há uma articulação para que o Congresso Nacional – que engavetou um substitutivo que aprofunda os direitos indígenas – possa tirar do limbo essa proposta e discuti-la com as gentes. “Foi produzido um documento, com novas propostas, para um novo estatuto dos povos indígenas e isso já foi encaminhado à Câmara. Agora, estamos lutando por uma Comissão Especial que encaminhe o debate e a aprovação”. Paulino entende que a partilha de informações com as nacionalidades de outros países, que já avançaram um pouco mais no debate da plurinacionalidade, tem de alguma forma trazido esse tema para dentro da discussão no Brasil, e o processo tende a se aprofundar.


De qualquer forma, as nacionalidades originárias do Brasil sabem que não será possível importar modelos ou seguir exemplos de povos como os do Equador ou Bolívia. Existem especificidades que exigem propostas criativas e diferentes. O que talvez precise avançar é o reforço da ideia de que o Brasil também é multiétnico e pluricultural. Já os passos que serão dados e os progressos nessa direção dependerão da correlação de forças que se expressa na sociedade brasileira, marcada pelo racismo. Como bem lembra Paulino Montejo, da ABIPI, os povos originários no Brasil estão ainda muito imbricados na luta pela terra, contra a usurpação de seu território, e sofrem a completa falta de estrutura e infinitas limitações materiais, além de terem de enfrentar a dificuldade de se articular num país continental. “Mas isso não significa que não esteja sendo travada uma luta intensa pela autodeterminação”.


Os negros e os quilombolas


Dentro da lógica do estado plurinacional, pelo menos no Brasil, se expressa uma complexidade, talvez a mais significativa, que precisa ser mais discutida: a do povo negro. Com uma história de sequestro e escravidão, essa multidão - mais de 25 milhões - foi arrancada à força do chão natal, nas mais variadas regiões do continente africano. Seus descendentes, tal e qual os povos originários, ao longo destes mais de 500 anos de escravidão, foram amalgamando na memória a herança de sua cosmovisão originária. Mais concretamente podemos falar dos quilombos, que se formaram nos primórdios da escravidão como uma das mais importantes lutas anticoloniais. Eram espaços de resistência negra, lugar no qual os escravos construíram histórias de liberdade e autodeterminação, podendo cultuar seus deuses e praticar suas formas de organizar a vida. Atualmente existem mais de duas mil comunidades quilombolas, em 24 Estados da nação. Mas, por ter sido uma sistemática vítima do racismo da sociedade brasileira, esta cultura sempre tendeu a sobreviver como resistência, muitas vezes perdendo parte de sua herança ancestral.


A questão das comunidades quilombolas começou a ser definida legalmente já na Constituição Federal de 1988, por conta da mobilização do movimento negro. Assim diz o Artigo 68, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias: “Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os respectivos títulos.” Esse foi um direito que acabou se concretizando, mas, na verdade, não avança muito no que diz respeito a sua autonomia, coisa que é absolutamente uma característica dessas comunidades desde os tempos imemoriais. A luta pela autonomia e por uma organização livre ainda está se fazendo muito lentamente, sem amparo na lei e sem respaldo político. No geral, se reconhece o direito das famílias à terra, mas não se discute ou se aceita muito bem a proposta de uma auto-organização em outras bases, que respeite a cultura tradicional baseada no coletivismo, numa justiça e prática religiosa próprias, e com uma organização baseada na eleição direta de seus dirigentes.


Vanda Gomes Pinedo, do Movimento Negro Unificado, lembra que na década de 90 do século passado, o militante argentino Juan Pinedo trouxe para o Brasil esse debate da ideia de nacionalidade, na qual questões como território e etnia estão visceralmente imbricadas. Mas, em nível nacional isso acabou causando vários conflitos. “É que naquela década vivíamos a explosão das ONGs, financiadas com dinheiro europeu ou estadunidense, e esse debate foi abafado. As propostas das ONGs eram outras e não tinham como ponto central a autonomia do povo negro”. Foi neste contexto que alguns movimentos mais radicais iniciaram, em 1992, a discussão da construção de um Projeto Político do Povo Negro para o Brasil, com a compreensão de que o território não é só uma coisa material, é também cultura. “Mas, ainda assim, esse é um tema difícil para nós, porque com a escravidão o negro perdeu muito da língua materna, dos costumes e isso acaba dificultando a discussão. Os povos indígenas, de alguma forma, conseguiram manter partes dos seus territórios ou podem lutar par recuperá-los, mas nós, os negros, tivemos nossas nacionalidades pulverizadas. Precisaríamos primeiro reconstituir essa territorialidade para então pensar melhor nossa posição aqui”.


Na verdade, o que Vanda anuncia é a necessidade de se começar a pensar o tema do negro – e também da mestiçagem - como um dos nós centrais da identidade brasileira, porque, afinal, a inserção do negro no Brasil rompeu com as barreiras do quilombo. Com a abolição, milhões de homens e mulheres negros foram também ocupando as cidades e forjando uma nova conformação identitária. O censo de 2010 mostrou que, hoje, mais da metade da população brasileira se diz parda (mestiça) ou negra, o que torna esta a etnia preponderante no Brasil, logo, devendo assumir a sua posição de indicadora de caminhos. Na lógica do capitalismo dependente que toma conta do país, o lugar do negro, apesar de ser maioria, ainda é o da marginalidade, da pobreza, da exclusão da vida digna. Pensar-se como “nacionalidade” poderia fazer com que houvesse tensão suficiente para fazer avançar o debate sobre seu papel na sociedade brasileira e sua condição de, autonomamente, propor novos caminhos para esta nação.


Mas, estas veredas ainda precisam ser abertas. Vanda avalia que houve um grande esvaziamento do movimento negro nos últimos dez anos, muito por conta das divergências partidárias, o que mostra que o governo de Luis Inácio também influiu negativamente nessa articulação. Muitas lideranças importantes foram cooptadas para ocupar cargos no governo, deixando a militância sem constituir novas lideranças. Em consequência, o Projeto do Povo Negro também caiu no esquecimento e até o Congresso que estava pensado para 2010 não aconteceu por conta da desmobilização. Mesmo o Estatuto da Igualdade Racial não é considerado um grande avanço, porque ele de nada adianta se não há um movimento forte a impulsionar as conquistas.


Desmontado pela política das ONGs e pela acomodação no governo petista, as lideranças do que ainda resta de movimento negro no Brasil estão em grande desvantagem no debate sobre a plurinacionalidade. Porque precisam empreender grandes esforços para manter minimamente o que de mais próximo têm de um espaço geográfico próprio, que são os quilombos. “Apesar de existirem em quase todos os estados, há muito pouco do pensamento africano sendo trabalhado nos quilombos. O que temos é algo da forma de produzir e alguns laços culturais muito tênues. Temos observado um avanço significativo das religiões evangélicas dentro dos quilombos, o que também ajuda a destruir as lembranças da religiosidade africana. Tudo isso vai levando também a uma perda sistemática do território, pois as pessoas vão se integrando à vida fora do quilombo”. Não bastasse isso, ainda precisariam avançar significativamente no debate da sua condição subalterna – mesmo quando maioria numérica - na sociedade brasileira.


Em Santa Catarina, o MNU trabalha nos dez quilombos certificados, embora existam pelo menos mais dez, também seguidos de perto pelo movimento. Um deles, o da Invernada, tem sido acompanhado sistematicamente por mais de dez anos e ainda assim os avanços são muito poucos. “Temos trabalhado a música, a identidade, o modo de vida, mas não é coisa fácil. No Morro do Fortunato o quilombo conseguiu eliminar as cercas, as casinhas ficam próximas e as pessoas se comunicam gritando umas para as outras. Isso faz parte da cultura africana. Lá, por estar em cima de um morro, mais distante da cidade, a comunidade tem conseguido avançar”.


A coordenadora nacional do MNU sabe que esta é uma luta inconclusa e difícil. “Nós temos maioria negra no país, mas também tivemos 500 anos de dominação, décadas de ditadura e há muito pouco tempo conseguimos conhecer nossa história. Nós agora estamos recuperando isso, mostrando que tivemos guerreiros, vencedores, que temos um pensamento próprio, uma cultura. Isso precisa ser construído todos os dias, nas escolas, na família, nos meios de comunicação. Nossa empreitada é fortalecer essa identidade, e só depois disso podemos lutar por território”. Segundo Vanda, os negros ainda estão num processo de tentativa de inclusão no mundo capitalista que aí está. Romper com essa idéia é tarefa difícil demais, mas não impossível.


Marilu Lima, coordenadora do Projeto Antonieta de Barros, da Assembléia Legislativa de Santa Catarina, que procura oferecer instrumentos para os jovens negros estudarem e entrarem no mercado de trabalho, é uma das que percebe que negros estão mais preocupados agora com a inclusão no sistema e por isso não conseguem passar de determinado ponto. “Isso não significa o fracasso do negro, mas sim do sistema capitalista”. Na verdade, ela admite que questões como autonomia cultural e política – elementos da idéia da plurinacionalidade - ainda não conseguiram entrar na agenda do movimento negro. O projeto, que leva o nome da primeira negra a se eleger deputada estadual em Santa Catarina, Antonieta de Barros, ocupa mais de 200 adolescentes numa proposta de estágio. Mas, no fundo, acaba sendo apenas uma forma de garantir a sobrevivência.


Kleber Bitencout é um jovem negro que atua no projeto da AL de Santa Catarina. Ele admite que aquele é um espaço de expansão do negro dentro do sistema. Morador da Comunidade do Mocotó, em Florianópolis, ele faz parte de um grupo de estudos no qual os jovens discutem temas como cotas, educação, violência. “Não chegamos a discutir coisas como plurinacionalidade”. E, na verdade, como já admitiu Vanda, o próprio Movimento Negro não tem isso na sua agenda.


Segundo Kleber o racismo é coisa tão presente na vida dos negros que fica bem difícil avançar na discussão de outro modo de organizar a vida. Ele lembra que mesmo sendo um estudante universitário, não está imune dos ataques de racismo. “Tive um professor que dizia: eu mandaria esses negros todos de volta para África. Assim como também já sofri discriminação por ser quem sou. Por estar sem documento fui confundido com um assaltante. É o racismo. A gente está todo o dia lidando com isso”.


Há muito que avançar no Brasil


A partir de um acompanhamento sistemático de jornais nacionais, em cada estado brasileiro, temos observado que tanto a questão indígena como as que envolvem o negro, muito pouco aparecem. No caso dos povos originários são ações muito pontuais, como as relacionadas à saúde, algum tipo de violência contra indígenas, casos de demarcação de terra. No que diz respeito aos negros, um ou outro caso de racismo, desconectado da totalidade da questão, ou alguma reportagem sobre população carcerária e marginalidade. Não há um debate real sobre os elementos que envolvem a quase exclusão destas importantes culturas da vida nacional. Não se fala muito sobre as políticas públicas ligadas a elas e muito menos sobre a possibilidade de se organizarem como nacionalidades autônomas e livres.


O fato é que a cultura invasora, europeia, branca, impôs anos e anos de submissão com esse projeto de capitalismo dependente e subdesenvolvido, que levaram a um profundo sentimento de inferioridade. A difusão de que o belo é ser branco, o culto é ser formado pelas escolas tradicionais e o bom é ser cristão levaram as populações autóctones e as comunidades negras a sentirem suas crenças e cultura como coisa errada e inferior, criando um caldo perfeito para a dominação. Hoje, os movimentos originários em toda a América Latina estão em processo de libertação dessa visão colonial, ainda dependente e preconceituosa, gestando assim um campo fértil para o nascimento de uma identidade latino-americana fora dos padrões impostos pela cultura alienígena. É a possibilidade concreta de se fazer aquilo que ensinava o educador Simón Rodríguez ao dizer: ou inventamos ou erramos! Para os povos originários é chegada a hora de inventar. Cabe também à comunidade negra encontrar caminhos de libertação que possam garantir o fim do racismo e a retomada de uma vida em consonância com suas heranças ancestrais, tendo como sul propostas mais generosas como o socialismo, ou o sumak causay ou qualquer outra “inventada” pelas gentes daqui.




Fonte: Ciranda.net