sexta-feira, 15 de abril de 2011

Ora, Ora! Vice-reitora faz críticas à gestão da UFOPA


Mensagem à Comunidade Acadêmica da UFOPA
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Estou ocupando a Vice-Ritoria Pro-Tempore da UFOPA, nomeada pelo Ministro de Estado de Educação Fernando Haddad, em novembro de 2009. Fui professora do Campus da UFRA em Santarém, onde, com muito orgulho, ao lado de meus sete colegas contribuímos para formar três turmas de engenheiros florestais, em condições de infra-estrutura muito precárias, mas compreendendo a missão pioneira de um dos cursos que abriu fronteiras para a grande universidade que estamos construindo.
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A minha mensagem traz um esclarecimento sobre a minha visão dos acontecimentos que mobilizam nossa comunidade acadêmica. A minha trajetória desde meus 18 anos, se pautou por um engajamento pessoal, profissional e intelectual nas transformações sociais e pela democracia. Vejo a UFOPA como um instrumento de produção de conhecimentos e de formação de capital humano voltado para o desenvolvimento das vocações locais da Amazônia e como propulsora da criatividade intelectual do nosso povo, em toda sua diversidade sociocultural. A UFOPA foi criada num contexto de política pública favorável, por um programa Federal de fortalecimento do ensino público no Brasil e com vários meios de democratização do acesso ao ensino superior.
Em 05 de abril de 2011 a UFOPA completou um ano e cinco meses de existência legal e podemos contabilizar conquistas inegáveis na i) realização de concursos públicos para docentes e técnicos; ii) o início das obras de ampliação das instalações; iii) a oferta de vagas pelo PARFOR, no qual a UFOPA se engaja decididamente na formação superior dos professores da Educação Básica; iii) a oferta de 1.250 vagas e de novos cursos, alguns dos quais respondendo a demandas candentes da sociedade local; iv) projetos de extensão que realizam atividades formativas e de assessoramento em várias frentes de trabalho no município; v) criação de novos cursos de especialização vi) os esforços para que em breve tenhamos o primeiro curso de doutorado, sendo que já temos dois cursos de mestrados aprovados.
Essas e outras conquistas foram possíveis graças à capacidade da Universidade em canalizar os investimentos do Programa REUNI- Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, instituído pelo Decreto 6.096/2007.
A UFOPA é hoje um ambiente de criatividade, discussão de idéias, inovações, encontros de múltiplas experiências trazidas por colegas de todas as regiões do Brasil e alguns de outros países, dando vida e enriquecendo a proposta do Governo Federal de criar uma universidade com forte identidade e atuação nas questões amazônicas, com qualidade e estatura acadêmica nacional e internacional. Mas, também, como todas as universidades, é um ambiente de questionamentos, de debate e de contraditórios. A controvérsia e a problematização são forças motrizes da renovação do conhecimento e das mudanças sociais que ocorrem em todos os lugares do mundo.
O processo de implantação da UFOPA, ao lado das inúmeras conquistas, em tão pouco tempo, também vem sendo acompanhado de alguns problemas de gestão e conturbações de ordem política, os quais prejudicam a imagem externa da universidade.
Ainda na qualidade de Vice-Reitora, cargo que aceitei entusiasmada pelo projeto da UFOPA, me sinto na obrigação de manifestar os aspectos que acredito merecerem atenção para que a UFOPA cumpra plenamente seus objetivos.
1. Sobre a Gestão Administrativa
Mesmo sendo Pro-Tempore, a administração superior deveria ter criado em seu primeiro ano, um Conselho Superior Pro-Tempore (CONSUN), reunindo membros da direção e representantes docentes, discentes e técnicos. Porque as decisões que estão sendo tomadas terão repercussões profundas no destino da Universidade, Propus ao Reitor, a criação do CONSUN em abril de 2010, quando dirigi as primeiras ações da Comissão Estatuinte. Um ano depois, o CONSUN ainda não foi formalizado.
Mesmo sendo direção Pro-Tempore, a direção da universidade deve implementar um processo de gestão em que haja planejamento institucional, pactuação de objetivos e metas anuais de forma colegiada (CONSUN Pro-Tempore seria a instância adequada), com mecanismos de monitoramento de resultados, designação de responsabilidades e prazos.
A UFOPA está submetida a um método personificado de comando, com excessivos poderes de decisões em algumas Pro-Reitorias. A falta de planejamento institucional fragmenta a ação das unidades acadêmicas, despotencializando a sinergia necessária para alavancar as competências internas. O planejamento se dá por iniciativa dos institutos, sob o risco de prejuízo de efetividade por não estar amparado num planejamento superior. Decisões que envolvem a vida das pessoas na universidade são tomadas de forma unilateral, gerando conflitos e desconforto entre a comunidade.
A temporariedade da direção não justifica a ausência de um diálogo amplo com a comunidade sobre o volume de recursos que o Governo Federal está investindo na implantação da universidade, as prioridades de investimentos, as dificuldades de atender demandas, os prazos das obras, as soluções intermediárias de acomodação. O balanço público dos recursos financeiros executados no Orçamento de 2010 e o quanto a universidade internalizou de recursos em serviços e aquisição de bens na região, demonstraria à sociedade a importância deste grande investimento no desenvolvimento regional.
A UFOPA está em construção e a equipe que assumiu a incumbência de implementá-la não pode arrogar-se como portadora de todas as verdades. São todos colegas, com funções de chefia e subordinação nesta conjuntura, mas que poderão reencontrar-se em posições opostas no futuro. O espírito de construção institucional coletiva em muito ajudaria para que colegas antigos e os novos se integrassem de forma harmoniosa no projeto da universidade.
2. Sobre a democracia na gestão
Este é um dos aspectos mais frágeis da direção Pro-Tempore. Não há como esconder que o processo de debates anteriores à criação da UFOPA foi imperfeito por causa da metodologia que privilegiou eventos de informação em detrimento de mecanismos de esclarecimentos e convencimento, considerando que a nova universidade trazia mudanças de grande impacto acadêmico. Palestras de membros da Comissão de Implantação, parlamentares e de autoridades do Governo apresentando o Projeto da UFOPA foram insuficientes para criar a empatia necessária entre a nova universidade e a comunidade local.
A comunidade regional tem uma tradição de debate de políticas públicas arraigada. Planos de governo, como Plano BR-163 Sustentável, ZEE, foram amplamente debatidos e modificados com a participação dos atores locais. Uma universidade pode ser diferente, enquanto temática, mas como política pública, deveria ser discutida, ponderada e (no que pudesse ser pactuado) aperfeiçoada a partir da participação local.
Em dezembro de 2009, em sessão promovida pelo Ministério Público Federal, na qual a comunidade estudantil pleiteava participar da discussão do modelo acadêmico, apontando incertezas que perduram ainda hoje na formulação dos percursos acadêmicos, representei a UFOPA, comprometendo a universidade em promover todo o debate necessário para o aperfeiçoamento do processo democrático. Porém a instituição não deu atenção a esse compromisso.
Um ano e cinco meses depois da UFOPA criada, ainda perduram indefinições quanto à algumas graduações, certificações, diplomação, percursos acadêmicos, métodos de avaliação entre estudantes, mas também entre professores e dirigentes. Isso se deve a um diálogo precário, restrito aos dirigentes e, mesmo assim, desprovido de metodologias apropriadas para lidar com divergências.
A forma como se deu a substituição da Diretora do ICS, recentemente, com a nomeação de uma colega de fora da universidade, quando o colegiado discutia a indicação de um membro do Instituto, é difícil de ser assimilada numa universidade. O Colegiado do Instituto foi desmobilizado e eu, que na condição de docente, vinha contribuindo na formulação do curso de Planejamento de Desenvolvimento Regional, fui afastada sumariamente.
Atuando como Vice-Reitora tive minha função esvaziada nesse primeiro ano de implantação, tendo as minhas atribuições reduzidas ao que estabelece a Portaria no. 753 de dezembro de 2010: “reunir com as entidades e os dirigentes dos segmentos universitários, incluindo as representações sindicais, os representantes estudantis e os representantes de associações, principalmente quando solicitado encontro ou reunião com a Reitoria”. Não sou a Vice-Reitora de fato, portanto, não posso assumir as responsabilidades pelas decisões das quais não participo.
Esses e outros fatos que não cabe tratar aqui contribuíram para gerar insatisfação entre estudantes, docentes e técnicos, as quais, sem uma instância colegiada de deliberações (CONSUN), ficaram sem locus de negociação. A manifestação do DCE na aula magna foi uma atitude incorreta na forma como os estudantes interviram numa programação da instituição, frustrando os alunos, professores e o ilustre palestrante. Porém, o DCE poderia estar na mesa, representando a comunidade estudantil, razão da existência da universidade, como ocorreu no ano passado.
A instauração de processos administrativos (PADs), instituídos pela administração superior para apurar os fatos caracterizados como irregularidades é uma prerrogativa jurídica dos gestores. Contudo, os fatos ocorridos não caracterizam delitos que justifiquem os PADs, pois acima de tudo, espera-se da universidade o respeito ao direito de expressão como princípio democrático inalienável. Os PADs trouxeram um clima de instabilidade política, de desconforto e de intimidação entre os membros da comunidade acadêmica, especialmente em relação aos colegas em estágio probatório. O temor de que opiniões contrárias à direção terão como resposta a coerção. Universidades são lugares de efeverscência do pensamento crítico, de manifestações políticas, de formulação de bases teóricas para o aperfeiçoamento das democracias.
Nesse sentido, me solidarizo com os segmentos dos estudantes, dos técnicos e dos docentes, contrária aos PADs. Precisamos instalar urgentemente na Universidade, outras formas de diálogo que permitam a livre expressão das opiniões e a construção de consensos, regidos pelos princípios da política pública que estamos implementando no ensino superior, pela capacidade de mediação e pela racionalidade.
Diante destes fatos, resumo minha mensagem os seguintes termos:
I) Não obstante os bons resultados apresentados neste primeiro ano, a Administração Pro-Tempore da UFOPA deve rever seus métodos de gestão e a sua concepção em relação ao trato das divergências. Evitar o aprofundamento da crise que, desnecessariamente, está prejudicando as relações internas e a imagem externa da universidade. Defendo a instalação imediata do CONSUN Pro-Tempore como instância de resolução das questões que afetam toda a comunidade.
II) Democracia pressupõe se fazer ouvido, mas também ouvir. Que o diálogo entre Administração Superior e setores críticos se dê em ambiente de respeito mútuo, com arenas de debate definidos e dentro dos muros da universidade. E ainda com propostas concretas que possam aperfeiçoar o projeto em curso. Que a primeira tarefa do CONSUN seja promover um ciclo de debates internos que considere as propostas de aperfeiçoamento gestadas a partir da avaliação de todos os segmentos e unidades acadêmicas sobre este primeiro ano de implantação da UFOPA. O Artigo 3º da LDB-Lei de Diretrizes e Bases da Educação estabelecem os princípios que nos asseguram essa prerrogativa.
iii) Continuo disposta a contribuir, acima de tudo como educadora, na avaliação, no planejamento, na gestão e nas atividades acadêmicas da universidade. Porém, deixo claro: ou exerço plenamente a autoridade conferida em Lei à Vice-Reitoria ou não vejo sentido em estar no cargo que ocupo. Reivindico também participar da construção dos programas do Instituto de Ciências da Sociedade, dando prosseguimento ao engajamento acadêmico ao qual tenho direito como docente desta Universidade.
Santarém-PA, 13 de abril de 2011.

Fonte: Blog de Jeso

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